quinta-feira, 7 de junho de 2012

Eros e Psique

"Conta a lenda que dormia
Uma Princesa encantada
A quem só despertaria
Um Infante, que viria
De além do muro da estrada.
Ele tinha que, tentado,
Vencer o mal e o bem,
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por o que à Princesa vem.
A Princesa adormecida,
Se espera, dormindo espera,
Sonha em morte a sua vida, 
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.
Longe o Infante, esforçado,
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado,
Ele dela é ignorado,
Ela para ele é ninguém.
Mas cada um cumpre o Destino
Ela dormindo encantada
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino 
Que faz existir a estrada.
E, se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora, 
E falso, ele vem seguro, 
E vencendo estrada e muro,
Chega onde em sono ela mora.
E, indo tonto do que houvera,
A cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera, 
E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia." 

Do mestre, Fernando Pessoa.
Não é lindo?
Eros e Psique, de Canova, no Louvre