sexta-feira, 8 de junho de 2012

Senta que lá vem história !


Pesquisando sobre Eros e Psiquê, me encantei com o romance dos dois... E encontrei algumas referências bem interessantes, que me remeteram a outras histórias...
Psiquê, mortal e linda, filha de um rei não muito importante, é alvo da inveja de Afrodite, a deusa da beleza, que manda seu filho Eros a acertar com uma flecha, fazendo assim com que  a princesa se apaixone pelo ser mais horrendo que por ali haja.
Sim, Eros e Cupido são a mesma divindade, mas não aquela coisinha rechonchuda e infantil, mas um belo rapaz com sua aljava e flechas de paixão...
Ocorre que Eros, encantado com a beleza de Psiquê, se arranha com uma de suas flechas e se apaixona perdidamente por ela. ( Até aí, quem lembrou da rainha bonita e malvada, que manda Branca de Neve para a floresta com o caçador, por pura inveja, dando ordens explícitas sobre sua morte?  Pois é , o caçador também fraquejou...)
Apaixonado que estava, Eros não cumpriu a ordem de sua mãe Afrodite, e o tempo foi passando sem que a princesa arrumasse um pretendente, o que passou a preocupar seu velho pai, que já havia casado duas filhas não tão belas, e não podia entender como Psiqué continuava sozinha. Procurou então um oráculo que, graças à armação de Eros, disse que a filha estava fadada a casar-se com um monstro.  Muito desolado, porém obediente, o pai abandonou a filha num rochedo à própria sorte,  onde o monstro viria buscá-la.  Psiquê acabou adormecendo no rochedo e foi levada por Zéfiro, deus do vento, a um palácio suntuoso, com maravilhosas iguarias.  Lá, foi recebida pelo “monstro” que, sem nunca mostrar a sua face, a iniciou em todos os prazeres e delícias do amor... Todas as noites eram noites de amor e paixão, e Psiquê estava muito feliz , embora sem conhecer o rosto de seu marido.  ( Quem lembrou da Bela e a Fera, sozinhos naquele castelo enorme?  Depois daquela valsa memorável, com trilha sonora vencedora do Oscar, hummm....)
Acontece que o Inimigo sempre e todo o tempo procura uma brecha para se meter nas relações humanas ( e pelo jeito nas divinas também) e plantou na Psiquê uma saudade de suas irmãs, que foram visitá-la depois dos pedidos insistentes da princesa a seu esposo.  As irmãs, ao verem a felicidade e riqueza de Psiquê, também ficaram encharcadas de inveja ( de novo , a inveja) e começaram uma teia de intrigas contra o marido da outra, dizendo que na verdade ele devia ser uma serpente disfarçada, e que a estava alimentando para depois devorá-la.  Tanto fizeram que Psiquê,  cheia de dúvidas, resolve uma noite espiar o rosto do marido adormecido, depois de uma fantástica sessão de amor.  Vai armada com uma faca, pois se fosse verdade o que as irmãs afirmavam, melhor seria matar logo a fera... Qual não foi o choque ao ver, não um monstro horrendo, mas as feições divinas do deus do amor, que escondia o rosto para que a mãe não descobrisse sua desobediência. Psiquê ficou tão estarrecida com a beleza do esposo que deixou pingar o óleo quente da lamparina no ombro de Eros, que acordou assustado e traído com a falta de confiança da moça: abriu suas asas e voou janela afora , ele que tanto havia advertido à amada sobre a intriga das irmãs .  Psiquê, desesperada, se joga da janela do palácio no cume da montanha. Zéfiro, no entanto, a socorre  e a traz de volta ao palácio. As malvadas irmãs, acreditando que o lindo Eros olharia para elas agora que estava magoado com Psiquê, atiram-se também pela janela atrás dele, mas o que as aguarda é somente o precipício... ( Quem leu a história de Vasalisa, vai lembrar das irmãs malvadas que viraram carvão ... ou ainda das horrorosas irmãs postiças de Cinderela...)
Começa então a peregrinação de Psiquê, sem dormir ou comer, na busca para recuperar seu amor.  Como na lenda da Donzela sem mãos, ela vaga sem rumo até encontrar um castelo onde mora Deméter ( lembram de Deméter, a mãe-terra, mãe de Perséfone?).
Psiquê ajuda Deméter a separar grãos de trigo, espigas de milho e ferramentas, que estavam misturadas por todo o palácio, e Deméter, em retribuição, como a sábia Baba Yaga de Vasalisa, como a Mulher Selvagem que habita em nós, como  a Mãe-Terra protetora e Voz do Intuição que habita nosso íntimo,   ensina à moça o caminho para recuperar Eros: conseguir o perdão de sua mãe Afrodite.
Afrodite estava muito satisfeita cuidando da chaga  que a  traição de Psiquê havia causado a Eros, e não gostou nada de ver aquela mortalzinha chegando, propondo reconciliação.  Assim, deu a Psiquê uma tarefa , certa de que ela não a cumpriria, firmando de vez a certeza de que ela não era digna de seu filho.  E assim parte Psiquê,  como  tantos outros heróis, para ser testada em uma tarefa impossível de se cumprir, e armada apenas de seu amor e coragem.
Afrodite coloca Psiquê num quarto repleto de grãos de diversas espécie ( de novo, os grãos de Baba Yaga...) que ela deveria separar em pilhas.  A moça começa o trabalho e no meio da noite, adormece, extenuada.  Mesmo levando vários dias ela não conseguiria terminar tal triagem.  Porém um exército de formigas invade o quarto e faz todo o trabalho e, quando Psiquê acorda, o que era impossível estava feito.
Afrodite, contrariada, pensou logo em outra tarefa para a mortal, de preferência uma bem estafante e perigosa para que ela perdesse logo a sua beleza e juventude, motivos de seu ciúme.  Mandou a moça trazer a lã do velocino de ouro. Ora, o velocino de ouro costumava pastar próximo a um rio, cercado de outras feras. Psiquê não sabia como se aproximar dos animais para cortar-lhe a lã sem correr risco de vida.  Uma voz nos juncos, entretanto, lhe cochichou que, junto à margem onde os animais costumavam beber água, havia um espinheiro, e lá se prendiam vários tufos da lã dos animais, que ela poderia colher.  (Assim, uma vez mais, a boneca de Vasalisa, ou seja , a intuição, levou a heroína a conquistar o que parecia impossível.)
A mãe de Eros não se conformou com o sucesso da princesa e deu-lhe outra ordem: que trouxesse a escura água da nascente do rio Estige.  Tal nascente, no entanto, ficava no alto de uma montanha inacessível, e Psiquê, com um vaso nas mãos, imaginava o que fazer quando as águias de Zeus  surgem, tomam-lhe a ânfora e a levam até  a nascente no cume, enchendo-a e devolvendo-o à princesa. (Lembrei-me das águias de Gandalf salvando Frodo e Sam na Montanha da Perdição, e também da história da esposa devota enfrentando a montanha em “O urso da meia lua”).
Afrodite decide pegar pesado: com a desculpa que tinha desgastado um pouco de sua beleza com os cuidados  com a ferida do filho, manda Psiquê pedir a Perséfone uma caixa com um pouco de sua beleza.  Ora, como já postei aqui no blog, Perséfone tinha sido raptada por Hades, o Senhor dos Mortos, e levada para ser sua esposa no mundo inferior.  Afrodite imaginava que , mandando Psiquê para o mundo dos mortos, ela não teria como regressar.  ( A rainha malvada mostra sua cara de bruxa e tenta enfiar a maçã envenenada na goela da inocente Branca de Neve...)  Psiquê pensou em se jogar de uma alta torre para, morrendo, poder entrar no reino de Hades.  Foi com espanto que  ouviu a torre murmurar-lhe sobre uma caverna que dava acesso ao reino subterrâneo; a torre ensinou-lhe a driblar os perigos da jornada, como passar pelo cão Cérbero e ainda providenciou uma moeda para pagar a travessia de volta.  Instruiu ainda a princesa a não olhar o conteúdo da caixa que Perséfone lhe daria, pois a beleza dos deuses não era para olhos mortais.
A história não explica porque Perséfone atendeu  ao pedido da princesa; mas afinal não era sempre que aparecia alguém vivo por lá e a própria Perséfone também já tinha empreendido sua jornada de crescimento; talvez tenha sentido alguma simpatia por aquela menina bonita que estava virando mulher. De qualquer maneira, Psiquê volta com a caixa, mas... não sem ceder à tentação de dar uma olhada, pensando que a sua própria beleza pudesse estar desgastada depois de tantas provas. Ao abrir a caixa , lá não havia beleza mas um sono terrível que se apossou de Psiquê, deixando-a desacordada.
Como o rei da Donzela sem Mãos, entretanto, como Felipe que venceu todos os obstáculos para chegar à sua amada Aurora, que dormia seu eterno sono, como  o príncipe que, mesmo cego pelas maldades da bruxa consegue salvar Rapunzel de sua prisão , enfim, como  os meninos que se tornam homens quando aceitam e desejam proteger suas amadas , Eros recuperado resolve lutar pelo seu amor: desperta  Psiquê, devolve o conteúdo à caixa e orienta à princesa que a leve à Afrodite.  Enquanto ela faz isso, Eros pede ajuda a Zeus para  que aplaque a ira de Afrodite. Zeus ordena a Hermes que traga Psiquê ao Olimpo e , com uma taça de ambrosia, a faz imortal.  Com a benção de Zeus, está selada a união de Eros e Psiquê, e do amor dos dois nasce uma filha de nome Hedoné, que significa prazer.

Conclusão ( ou seria a moral da história?): Só depois da jornada de cada um, do abandono do efêmero jardim da adolescência para o ingresso na floresta da maturidade, simbólica e poderosa, (pois é o terreno onde o amor pode enfim fenecer e renascer a cada dia),  é que finalmente foram felizes para sempre....
* * *
Obs: Achei na Wikipedia: "Em grego  "psiquê" significa tanto "borboleta" como "alma".  Uma alegoria a imortalidade da alma, como a borboleta que depois de uma vida rastejante como lagarta, flutua na brisa do dia e torna-se um belo aspecto da primavera.  É considerada a alma humana purificada pelos sofrimentos e preparada para gozar a pura e verdadeira felicidade":   
UAU !!!! ATÉ A PRÓXIMA HISTÓRIA !!!!      


"L'enlèvement de Psyché", de Bouguereau