terça-feira, 16 de agosto de 2011

Mil e uma noites



Sério, se esse não fosse o papiro de Nefertiti seria, sem sombra de dúvida, a alcova de Sherazade....
Porque as histórias me fascinam, principalmente quando bem contadas. Há tantas histórias que quero contar aqui, histórias que desvendam coisas antigas através da sua simbologia, arquétipos poderosos presentes em nossas vidas e que mal damos conta que existem e que nos regem...
Qual o poder de uma história? Contada às crianças na sua tenra idade, transmitida através das gerações  em volta de fogões ou de fogueiras, lendas que não se perdem, fábulas que ensinam, contos que se eternizam... Livros que lemos na infância ou na juventude e nos flagramos dando de presente aos mais novos... Quem nunca disse ou ouviu essa frase: "Você precisa ler esse livro!" ?  Vale também pros filmes...
Há dois mil anos, aquele que ensinava por parábolas já sabia do poder de uma história!
As histórias são bálsamos, e essa frase nem é minha.  Mesmo aquelas que terminam abruptamente, com um final inesperado ou mesmo violento ou trágico, têm um objetivo a cumprir, seja de promover um alerta, seja de suscitar uma reflexão. Penso em Sherazade, que durante noites e noites contou histórias dentro de histórias, e assim aplacou a ira do Califa, transmutando sua fúria cega em amor e compaixão.  Histórias inspiram, transformam.  Histórias também assustam, dão medo, pavor. Histórias trazem à tona coisas que estavam esquecidas ou reprimidas em cantos empoeirados de nós mesmos, sentimentos trancados em quartos e armários escuros da nossa mente. E, trazendo à tona tais coisas, promovem libertação...
Lembrei de Peter Pan que vinha sentar-se à janela da jovem Wendy, para ouvir histórias sobre ele mesmo, contadas aos menores antes da hora de dormir... Como se, ouvindo suas próprias histórias, Peter Pan talvez encontrasse suas próprias respostas e resolvesse , finalmente, crescer...


"Sempre que se conta um conto de fadas, a noite vem.  Não importa o lugar, não importa a hora, não importa a estação do ano, o fato de uma história estar sendo contada faz com que um céu estrelado e um lua branca entrem sorrateiros pelo beiral e fiquem pairando acima da cabeça dos ouvintes. Às vezes, ao final de um conto, o aposento enche-se de amanhecer; outras vezes um fragmento de estrela fica pra trás, ou ainda uma faixa de luz rasga o céu tempestuoso.  E não importa o que tenha ficado para trás, é com essa dádiva que devemos trabalhar: é ela que devemos usar para criar alma."  Clarissa Estés

domingo, 14 de agosto de 2011

O segredo da felicidade

Estou relendo "O Alquimista". Interessante porque eu o li pela primeira vez em 1991, então faz exatamente 20 anos....
Fiquei pensando se, ao lê-lo agora, vou me deter nas mesmas partes da história que me detive há 20 anos, partes que falaram tanto à minha alma na época.  Embora esteja ainda no início do livro, já reencontrei frases e citações que voltaram a me tocar... Que bom, então o tempo não me fez insensível ao chamado da Lenda Pessoal...
Resolvi copiar aqui um pequenina parábola contada por Melquisedec ao jovem Santiago, antes que ele partisse em busca do seu tesouro.  Senta, que lá vem história !

"Certo mercador enviou seu filho para aprender o Segredo da Felicidade com o mais sábio de todos os homens. O rapaz andou quarenta dias pelo deserto até chegar a um belo castelo, no alto de uma montanha. Lá vivia o Sábio que o rapaz buscava.
Ao invés de encontrar um homem santo, porém, o nosso herói entrou numa sala e viu uma atividade imensa; mercadores entravam e saíam, pessoas conversavam pelos cantos, uma pequena orquestra tocava melodias suaves, e havia uma farta mesa com os mais deliciosos pratos daquela região do mundo. O Sábio conversava com todos, e o rapaz teve de esperar  duas horas até chegar sua vez de ser atendido.
O Sábio ouviu atentamente o motivo da vista do rapaz, mas disse-lhe que naquele momento não tinha tempo de explicar-lhe o Segredo da Felicidade. Sugeriu que o rapaz desse um passeio por seu palácio e voltasse dali a duas horas.
- Entretanto, quero lhe pedir um favor - completou o Sábio, entregando ao rapaz uma colher de chá, onde pingou duas gotas de óleo. - Enquanto você estiver caminhando carregue esta colher sem deixar que o óleo seja derramado.
O rapaz começou a subir e descer as escadarias do palácio, mantendo sempre os olhos fixos na colher.  Ao final de duas horas, retornou à presença do Sábio.
- Então - perguntou o Sábio - você viu as tapeçarias da Pérsia que estão na minha sala de jantar? Viu o jardim que o Mestre dos Jardineiros demorou dez anos para criar? Reparou nos belos pergaminhos da minha biblioteca?
O rapaz, envergonhado, confessou que não havia visto nada. Sua única preocupação era não derramar as gotas de óleo que o Sábio lhe havia confiado.
- Pois então volte e conheça as maravilhas do meu mundo - disse o Sábio. - Você não pode confiar num homem se não conhece a sua casa.
Já mais tranquilo, o rapaz pegou a colher e voltou a passear pelo palácio, desta vez reparando em todas as obras de arte que pendiam do teto e das paredes.  Viu os jardins, as montanhas ao redor, a delicadeza das flores, o requinte com que cada obra de arte estava colocada em seu lugar.  De volta à presença do Sábio, relatou pormenorizadamente tudo que havia visto.
- Mas onde estão as duas gotas de óleo que lhe confiei? - perguntou o Sábio.
Olhando para a colher, o rapaz percebeu que as havia derramado.
- Pois este é o único conselho que eu tenho para lhe dar - disse o mais Sábio dos Sábios. - O segredo da felicidade está em olhar todas as maravilhas do mundo, e nunca se esquecer das duas gotas de óleo na colher."

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

O predador da alma humana

Depois que a gente lê sobre a desolação e a consolação, começa a perceber com mais clareza o quanto é sutil o nosso Inimigo.  Diz Santo Inácio que o Inimigo da nossa alma é como o homem que quer ser aproveitar da donzela incauta contando-lhe mentiras para seduzi-la ; diz  Clarissa Estés que esse Inimigo é o predador de nós mesmos, que habita a nossa mente e nos sabota o tempo todo.
Seja pela visão religiosa ou pela visão psicanalítica, a verdade é que ele existe.  Às vezes ele é assustador e horrendo , querendo nos impor o medo e o desespero; no entanto, quando nos tornamos mais fortes e já não demonstramos  medo , ele age de tantas outras formas.  Ele planta a mal-querência,  a inveja, infla o nosso orgulho em proporções desmedidas para que nos tornemos cegos ao Bem. Ele se aproveita de nossas pequenas fragilidades, de nossos cansaços e de nossas carências, ora nos fazendo vacilantes, ora nos enchendo de espinhos, mostrando-nos a força de nossa fúria, para que saiamos desgovernados, maltratando aos que amamos, pois dessa forma torturamos a nós mesmos, sendo essa a sua  principal aspiração.
O predador da nossa alma nunca dorme, pois sabe que tem que tentar todas as chances de conseguir o seu objetivo. Como tão bem ilustrado na história da Donzela sem Mãos, ele troca as mensagens causando desentendimento e tristeza; ele procura corromper os homens com valores fugazes , tesouro, fama, vaidades. Ele se mete em cada casa e em cada família, procurando plantar discórdias e silêncios entre pais e filhos, entre marido e mulher, entre irmãos e amigos. Ele é desleal porque nos usa como escudo se aproveitando de nossas fragilidades; ele é traiçoeiro porque muda de máscara conforme a ocasião, alternando  a figura de besta assustadora com  o disfarce de pele de cordeiro.  Ele é perigoso porque alimenta nossos desejos às avessas, nos elevando às alturas através do nosso egoísmo.
Ele ainda falsamente nos consola com pensamentos de não ligo, não me importo, vocês vão ver, não sabe o que te esperam, e toda a consolação enganosa que se, no primeiro momento parece trazer alívio, na verdade só nos suga dentro de uma espiral descendente e escura.  Esses pensamentos não nos iluminam; esses pensamentos não nos trazem para a leveza da paz.
Diz o texto bíblico : “Sede sóbrios e vigiai, pois o Adversário anda à volta, como um leão que ruge, pronto a vos devorar.”
Contra a desolação e a consolação enganosa, devemos agir contra. Caminhar com decisão e firmeza no sentido contrário a pensamentos que nos arrastam para o lodo.  Diagnosticar logo o que é e o que não é do Bem.  Pensamentos que nos oprimem, que nos diminuem, que nos fazem rancorosos, nada disso vem da Força que buscamos.  Quem viu Guerra nas Estrelas sabe que a Força tem dois lados: devemos escolher a cada momento quem será o nosso mestre, e a que Voz devemos seguir.  Pois  o poder do lado Negro tem seu encanto, justamente para nos atrair e destruir. Para resistir a ele,  agere contra ! E que a Força esteja conosco.

Obs:  Para quem estiver interessado em  ler mais sobre a consolação e  desolação, e como agir nas duas situações, indico: