quarta-feira, 7 de maio de 2014

Buddy


A Família existe há vinte e dois anos e Ele chegou há quinze, uma bolinha peluda de olhinhos assustados, trazida pelo Pai.  Nunca ligou muito para seus brinquedos, gostava mesmo era de mascar chinelos.  Tinha medo de balões de aniversário e guarda-chuvas abertos, mas era um bom guardião, em todos os sentidos, embora sua raça fosse de caça, de antepassados que corriam por condados ingleses atrás de codornas...
Era afetuoso e amigo, bastava que a Mãe ficasse triste e lá vinha ele, forçar com o focinho até que sua mão ficasse sobre a cabeça dele, como se dissesse: "Ei, estou aqui pra você! " Era divertido correr com ele na calçada ou na pracinha, perseguindo pombos. Tinha uma força de traçao tão grande que talvez pudesse rebocar um trenó; muitas vezes rebocou a "Mãe-Pipa", numa carreira até o portão.  Mesmo do décimo-quinto andar começava a latir quando ouvia os Avós chegando na portaria do prédio... sim, mesmo daquela altura ele já sabia que seu grande amigo, o Vovô, estava chegando, e que os dois iriam passear.  A casa do Vovô era para onde ia, quando a Família viajava, com sua "mochila" feita, e a alegria de ser querido...

Mais novo, brincavam de corrida de obstáculos no corredor de sete metros da casa, as Crianças e a Mãe sentadas no chão para que ele, correndo, pulasse sobre as pernas delas... Mais velho, gostava das noites de filme e pipoca, todos empoleirados nos sofás da sala: "Ô Buddy, chega pra lá, eu tava aí!" E ele "liberava um espaço" pra mais um sentar.

A pracinha era seu playground, a rua era sua rotina; era conhecido e saudado por muitos, em sua inseparável parceria com o Vovô. Na porta da escola era a alegria das crianças que não tinham o seu próprio cão: "Ele é bonzinho? Posso fazer carinho? Qual o nome dele?" E a resposta era sempre a mesma: "Pode sim, ele é bonzinho, adora criança, o nome dele é Buddy, significa amigo, camarada...""

Na vila da Tijuca, onde esteve muitas vezes, era o "Budi", mimado pelas Tias queridas. Não tinha jeito, ele era meio sem modos, roubava presunto da mesa, adorava banana e nuggets, e a Mãe o enganava com mirabolantes canapés de manteiga, reuqueijão, peito de peru e pão, para que ele engolisse sus remédios.

Às vezes latia, sério, para a porta de entrada; a Mãe olhava através do olho mágico e não havia niguém lá fora; poucos segundos depois, no entanto, ouvia-se a porta de incêndio se fechar... E em uma madrugada ou outra ele uivava, e a Mãe nunca entendeu bem o porquê. Então ela levantava e conversava com ele, e uma vez ou duas sentou-se com ele no escuro e simplesmente esperou que passasse, aquele banzo atávico de matilhas barulhentas e felizes correndo atrás da caça...

Hoje, no Céu dos Cães ( sim, existe um Céu para eles) , o fiel companheiro, missão cumprida, volta a correr e a latir por campos ensolarados com seus amigos, orelhas ao vento, tentando abocanhar as borboletas...Valeu, Buddy !















quinta-feira, 1 de maio de 2014

O que importa

Quando tinha nove anos, em minha primeira comunhão, ganhei três livros que marcaram minha vida. Um deles contava as proezas de um Jesus menino, com os fatos de sua vida adulta sendo narrados como se tivessem tido lugar em sua infância, tendo os apóstolos como amigos ... O segundo, (também em segundo lugar, no  impacto que causou a mim)  mostrava  um menino cujo dedo verde podia transformar a vida das pessoas, interromper guerras e trazer alegria aos enfermos... Em primeríssimo lugar, porém, o terceiro  livro  gravou em meu coração algumas das mensagens mais tocantes que ainda hoje me acompanham... Há exatos quarenta anos atrás, conheci um princepezinho franzino que se achava responsável por sua flor... Uma rosa como outra qualquer, uma rosa que ele regou e que pôs sob a redoma.  Uma rosa que ele abrigou com o paravento.  Uma rosa da qual ele matou as larvas ( exceto duas ou três, por causa das borboletas).  A rosa que ele escutou gabar-se e queixar-se.  A sua rosa.  E sobre a qual, mais tarde, aprendeu com um amigo: "Foi o tempo que perdeste com a tua rosa que  fez a tua rosa tão importante..."
Amigos sempre nos ensinam. Ensinam com suas palavras e com seu silêncio.  Ensinam com seus exemplos e com os seus erros. Amigos compartilham a sabedoria adquirida porque confiam, porque cativam e se deixam cativar.  Porque perdem tempo com essa amizade. "Os homens não têm mais tempo de conhecer coisa alguma" - ensina pacientemente a raposa. "Compram tudo prontinho nas lojas. Mas como não existem lojas de amigos..."

"Os homens esqueceram essa verdade - disse a raposa. Mas tu não a deves esquecer. 
Tu te tornas eternamete responsável por aquilo que cativas. Tu és responsável pela rosa..."


Única