Cena de "O velho moinho", premiado com o Oscar
(Disney sabia das coisas...)
(Disney sabia das coisas...)
Ter nos tornado urbanos e civilizados em demasia nos fez perder o conhecimento de muitas coisas. Os símbolos, por exemplo. Não esses símbolos que o comércio e a mídia nos empurra mas os símbolos antiquíssimos, os arquétipos, a simbologia das coisas ocultas...
O moinho, por exemplo. Lembram do moinho, na história da Donzela sem Mãos? Pois é. Ele reaparece na definição, linda, de Kalil Gibran sobre o amor. O moinho é pra nós um elemento esquecido na correria do mundo industrializado, onde tudo vem pronto em saquinhos plásticos, inclusive os pensamentos...
O moinho é o meio pelo qual o grão é transformado em farinha, que faz o pão, alimento do espírito. O moinho representa também o processo criativo, a transformação das idéias. Na história da Donzela, o moinho abandonado do pai da donzela mostra o afastamento da vida criativa por esse homem que abdicou de sua nobre função de moleiro e se tornou apenas um rude lenhador, deixando-se iludir pelas futilidades do mundo, perdendo assim aquilo que lhe era mais caro, a sua filha amada.
O amor, segundo Gibran, nos mói até a extrema brancura, para que, transformados e purificados de nossas impurezas, possamos participar de algo maior, que é a confecção do alimento divino. Como diz o poeta, assim como o amor nos coroa, ele também nos crucifica. Sim, porque o amor verdadeiro é um coração que sangra... É com sangue que a mulher dá à luz os filhos; foi com sangue que Jesus selou seu amor por nós. Quem vê Vampire Diaries, já sabe: amor se escreve com sangue...
Como o dia dos Namorados se aproxima, deixo para vocês a sabedoria de Gibran na voz do Profeta, que transcende as eras.
E ele ergueu a fronte e olhou para a multidão,
e um silêncio caiu sobre todos, e com uma voz forte, disse:
Quando o amor vos chamar, segui-o,
Embora seus caminhos sejam agrestes e escarpados;
E quando ele vos envolver com suas asas, cedei-lhe,
Embora a espada oculta na sua plumagem possa ferir-vos;
E quando ele vos falar, acreditai nele,
Embora sua voz possa despedaçar vossos sonhos
Como o vento devasta o jardim.
Pois, da mesma forma que o amor vos coroa,
Assim ele vos crucifica.
E da mesma forma que contribui para vosso crescimento,
Trabalha para vossa queda.
E da mesma forma que alcança vossa altura
E acaricia vossos ramos mais tenros que se embalam ao sol,
Assim também desce até vossas raízes
E as sacode no seu apego à terra.
Como feixes de trigo, ele vos aperta junto ao seu coração.
Ele vos debulha para expor vossa nudez.
Ele vos peneira para libertar-vos das palhas.
Ele vos mói até a extrema brancura.
Ele vos amassa até que vos torneis maleáveis.
Então, ele vos leva ao fogo sagrado e vos transforma
No pão místico do banquete divino.
Todas essas coisas, o amor operará em vós
Para que conheçais os segredos de vossos corações
E, com esse conhecimento,
Vos convertais no pão místico do banquete divino.
Todavia, se no vosso temor,
Procurardes somente a paz do amor e o gozo do amor,
Então seria melhor para vós que cobrísseis vossa nudez
E abandonásseis a eira do amor,
Para entrar num mundo sem estações,
Onde rireis, mas não todos os vossos risos,
E chorareis, mas não todas as vossas lágrimas.
O amor nada dá senão de si próprio
E nada recebe senão de si próprio.
O amor não possui, nem se deixa possuir.
Porque o amor basta-se a si mesmo.
Quando um de vós ama, que não diga:
“Deus está no meu coração”,
Mas que diga antes:
"Eu estou no coração de Deus”.
E não imagineis que possais dirigir o curso do amor,
Pois o amor, se vos achar dignos,
Determinará ele próprio o vosso curso.
O amor não tem outro desejo
Senão o de atingir a sua plenitude.
Se, contudo, amardes e precisardes ter desejos,
Sejam estes os vossos desejos:
De vos diluirdes no amor e serdes como um riacho
Que canta sua melodia para a noite;
De conhecerdes a dor de sentir ternura demasiada;
De ficardes feridos por vossa própria compreensão do amor
E de sangrardes de boa vontade e com alegria;
De acordardes na aurora com o coração alado
E agradecerdes por um novo dia de amor;
De descansardes ao meio-dia
E meditardes sobre o êxtase do amor;
De voltardes para casa à noite com gratidão;
E de adormecerdes com uma prece no coração para o bem-amado,
E nos lábios uma canção de bem-aventurança.
Extraído do livro O Profeta, de Kalil Gibran